“Economia verde”: empresa dona do lixão que está matando Igarapé no Tarumã quer lucrar com biometano em Manaus
Manaus – Um grave crime ambiental está se desenrolando no quilômetro 13 da BR-174, com a construção de um depósito de lixo a céu aberto em uma zona desmatada dentro da Área de Proteção Permanente (APP) no Ramal Itaúba, a poucos metros do Igarapé do Leão, um dos principais pontos turísticos e de lazer de Manaus.
A devastação, que já ocupa uma área maior que 142 campos de futebol, tem gerado indignação e debates intensos, envolvendo a sociedade, empresários e políticos no Amazonas, incluindo a Assembleia Legislativa do Estado e a Câmara de Vereadores de Manaus, além de provocar discussões entre os membros do Tribunal de Contas do Estado do Amazonas.
Localizado no Ramal Itaúba, no bairro Tarumã, zona Oeste de Manaus, o novo aterro sanitário foi construído pela EcoManaus Ambiental S.A, uma empresa administrada pela Marquise Ambiental, e levanta polêmicas devido à sua proximidade alarmante com o Igarapé do Leão, o principal afluente que compõe a bacia hidrográfica do Tarumã-Açu. A imprensa local já documentou a morte de um dos braços do igarapé que cortava a propriedade, transformando-o em poças de lama.
As preocupações ambientais causadas pela construção do lixão ocorrem também devido ao impacto à fauna silvestre. Ao longo do percurso do ramal até o caminho do aterro, as placas pedem para os motoristas reduzirem a velocidade, visto que o local abriga espécies raras na região como o Sauim-de-Coleira.
Marquise adota “economia verde”
Em meio a essa situação controversa, a empresa Marquise Ambiental S/A, proprietária do aterro, está mirando na chamada “economia verde”. Os sócios e diretores da empresa, incluindo Hugo Nery dos Santos, Renan Vale de Carvalho, Andrea Coelho de Oliveira, Carlos André Bastos Lopes, Luiz Gustavo Libório Vianna e Thiago Gurgel de Oliveira Levy, anunciaram em maio deste ano uma parceria com a MDC para estudar a viabilidade de uma planta de biometano no aterro operado pela Marquise em Manaus, no Amazonas.
O plano é replicar o modelo de negócio da GNR Fortaleza, a primeira e única planta de biometano do Nordeste, que já corresponde a até 20% do gás natural comercializado pela Companhia de Gás do Ceará (Cegás). Em entrevista à agência epbr, Hugo Nery, presidente da Marquise Ambiental, explicou que, inicialmente, o gás renovável seria direcionado às indústrias na região, mas também há planos de expandi-lo para outros setores, como transporte e uso residencial.
O projeto ainda está em fase preliminar, mapeando o mercado e discutindo a possibilidade de integração do biometano na rede de gasodutos local. O investimento nas obras deve começar em dezoito meses, com o início da produção previsto para 2026, uma vez que é necessário acumular resíduos suficientes para justificar o investimento na planta.
O projeto da Marquise Ambiental abre a perspectiva de transformar um problema ambiental em uma oportunidade de “economia verde”, mas levanta questões sobre a responsabilidade da empresa na degradação ambiental que ocorreu em seu aterro sanitário próximo ao Igarapé do Leão. Como esse empreendimento será administrado e como o impacto ambiental será mitigado são questões cruciais que a empresa terá que abordar no futuro.
IPAAM autorizou
A autorização concedida pelo Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) para a construção do aterro sanitário da Marquise Ambiental, apesar de reconhecer a existência de danos à bacia hidrográfica, levanta sérias preocupações devido à subestimação dos prejuízos ambientais. No documento assinado pela diretora técnica, Maria do Carmo Neves dos Santos, em exercício da presidência, e pelo gerente Eduardo White, em exercício da diretoria técnica, a obra foi classificada como tendo um grande potencial poluidor.
No entanto, o Relatório de Impacto Ambiental (Rima) apresentado pela Marquise ao Ipaam parece minimizar os possíveis danos à bacia hidrográfica da região do Tarumã. Em particular, na seção que aborda os recursos hídricos da área, o relatório contém apenas duas linhas que mencionam a presença de “um pequeno igarapé que corta a propriedade de norte a sul”.
Essa discrepância entre a classificação do Ipaam e o conteúdo do relatório levanta questões sobre a adequação das avaliações ambientais e a eficácia do processo de autorização. É essencial que as autoridades ambientais garantam uma análise completa e precisa dos potenciais impactos ambientais antes de conceder autorizações para projetos que possam afetar o meio ambiente e os recursos hídricos da região. Atualmente, o local continua em atividade com uma licença de operação também emitida pelo IPAAM.
Conselheiro do TCE critica IPAAM
Tendo acompanhado o desdobramento do caso, o Conselheiro do TCE-AM, Josué Cláudio de Souza Neto, utilizou suas plataformas nas redes sociais para se posicionar de forma veemente contra os planos de implantação de um aterro sanitário em uma Área de Proteção Permanente (APP) na região da BR-174, inclusive lembrando que a construção é ilegal por contrariar decisão do STF. Confira:
“A lixeira do KM 13 na BR-174 recebeu uma licença de operação em maio deste ano. Peço a atenção para dois pontos MUITO IMPORTANTES: 1- existe decisão do STF, Superior Tribunal Federal, de proibir esse tipo de construção em áreas de proteção. Portanto, é uma construção ILEGAL.
2- A própria licença de operação confirma que o grau e potencial degradador e poluidor é GRANDE! Ora, a partir do momento que é dada uma licença a algo ILEGAL e que tem um alto PODER de POLUIÇÃO e degradação, a pergunta é: qual é o tamanho dessa vergonha? O que há por trás dessa licença VERGONHOSA? O que tem escondido atrás dessa licença ABSURDA? Que o próprio IPAAM – Instituto de Proteção do Meio Ambiente faz questão de defender e DESPROTEGER o meio ambiente na maior capital da Amazônia, destruindo, poluindo, degradando o segundo maior rio de Manaus. Um exemplo de proteção que a Amazônia deveria dar aos demais países, O Amazonas está desprotegendo nossa Floresta, nossos rios, igarapés e nossos animais.
CMM convoca Ipaam e Semmas
A Câmara Municipal de Manaus (CMM) aprovou um requerimento para convocar o presidente do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), Juliano Valente, o presidente da Secretaria de Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semmas), Antônio Stroski e o secretário Municipal de Limpeza Pública, Sabbá Reis. O requerimento foi aprovado na quarta-feira (23/08). Segundo autor do requerimento, Caio André (Podemos), os representantes dos órgãos devem comparecer a CMM já no início desta semana para esclarecer pontos sobre a licença ambiental concedida para a construção do lixão.